Câmara hiperbárica: uma tendência de longevidade

É o mais recente hype da longevidade — há alguns anos a palavra de ordem no meio da saúde e do bem-estar. Justin Bieber, Neymar, Cristiano Ronaldo e Cláudia Raia são alguns nomes que já se mostraram a recorrer ao tratamento na câmara hiperbárica, em busca de recuperação física, redução de stress, melhoria do sono ou ainda para evitar os efeitos do tempo no corpo. O conceito é de que o oxigénio, quando submetido a determinadas pressões, aumenta a sua solubilidade. Ou seja, numa pressão normal de 1 atmosfera respiramos oxigénio a 21%. Portanto, a câmara hiperbárica aumenta a pressão atmosférica para depois fornecer oxigénio a 100%, a fim de melhorar a distribuição no sangue e, consequentemente, a todas as células do corpo. O dispositivo já é usado há décadas em contexto hospitalar, mas ganha cada vez mais espaço em clínicas de estética, ginásios, centros de wellness e há até quem prefira ter uma versão em casa.
Em 2021 o empreendedor norte-americano Bryan Johnson começou uma busca por tratamentos que o fizessem viver para sempre, e chegou a gastar milhões de dólares no processo. No começo de 2025, a Netflix lançou um documentário a contar a sua história e a mostrar tudo o que já fez para tentar tornar-se “imortal”: desde os mais de 50 comprimidos que toma por dia até a transfusão de plasma com o filho de 17 anos. Há três meses começou a fazer sessões na câmara hiperbárica que tem em casa, num formato mais similar a uma cápsula de uma nave espacial com bancos vermelhos. “Olhamos para toda a literatura científica e procurámos os tratamentos que pudessem aumentar o tempo de vida em até 30%. A terapia de oxigénio hiperbárica não tem o tipo de evidência que diga que funciona garantidamente, mas tem evidências interessantes”, justificou, quando se desafiou a iniciar o protocolo de 60 sessões durante 90 dias. Ao fim do período, Bryan Johnson alega que os seus biomarcadores melhoraram, com benefícios sentidos na pele, redução total das inflamações no corpo, aumento da vascularização sanguínea e diminuição do risco de desenvolver demência. “É a terapia mais eficaz que eu já fiz desde que comecei esta jornada”, diz o homem, que tem 47 anos, mas uma idade biológica que alega ser avaliada nos 20. Agora, pretende fazer 20 sessões a cada três meses para manter os resultados.
“O primeiro clube de longevidade de Portugal”Max Wolter pode estar a seguir os mesmos passos de Bryan Jonhson, mas em Lisboa. “Tenho 39 anos, mas a minha idade biológica é 20”, diz ao Observador um dos sócios fundadores do Healthy Horizon, o espaço que abriu em maio em Lisboa e que se autoproclama o “primeiro clube de longevidade de Portugal”. “Decidi seguir aquilo que é a minha paixão na vida. Passei muitos anos a otimizar a minha saúde em todos os níveis. Então, basicamente, este lugar é o que eu gostaria de poder fazer toda semana para me manter saudável”, afirma. O centro foi idealizado durante um voo entre Amsterdão e Lisboa, quando Wolter e o arquiteto português João Corleo regressavam de um evento de biohacking (outra das palavras do momento quando o assunto é bem-estar), em outubro de 2023. “Pensámos sobre como criar algo acessível a todos, para empoderar as pessoas neste conhecimento, para que tenham a soberania da própria saúde. Sem depender de outra pessoa para prover a melhor qualidade de vida que podem ter”, diz Corleo.
O terceiro elemento desta equação é Daniel Richter, um empresário suíço reformado há três anos, que decidiu investir na ideia. “Tinha de encontrar um novo propósito na vida, algo novo para me motivar todos os dias. E a longevidade, é claro, na minha idade, é o que queremos saber e conhecer. Aqui posso beneficiar da minha melhor versão e também partilhar com outras pessoas.”
"O que temos aqui não é uma clínica onde é preciso agendar um horário com um profissional e ele diz-te o que fazer. Queremos que as pessoas aprendam e decidam por conta própria do que precisam. Porque a intuição do nosso corpo é algo muito negligenciado na medicina ocidental."
Max Wolter, fundador do Healthy Horizon
A virar duas esquinas a partir da Rua da Escola Politécnica, numa zona calma do Príncipe Real, é através das janelas grandes de vidro que se vê o que se passa lá dentro. Mesmo assim, é difícil desvendar, já que não há letreiro na porta e o espaço não está anunciado com grande pompa e circunstância, pelo contrário: a arquitetura é minimalista, há poucos estímulos sensoriais. Ao entrar vemos logo os sapatos enfileirados num banco baixo, de frente para o balcão do que parece um bar ou café, que no menu tem uma lista de cocktails sem álcool. Ao lado, um sofá estilizado com dois níveis e muitos pufes distribuídos pelo chão. É só ao olhar mesmo para dentro que vemos o que mais há ali: camas, cadeiras e a cápsula que mais parece saída de um filme de ficção científica. “O que temos aqui não é uma clínica onde é preciso agendar um horário com um profissional e ele diz-te o que fazer. Queremos que as pessoas aprendam e decidam por conta própria do que precisam. Porque a intuição do nosso corpo é algo muito negligenciado na medicina ocidental”, diz Max Wolter.
A câmara hiperbárica é uma das tecnologias que os fundadores do clube consideram importantes para melhorar a qualidade de vida. “Há cinco pilares essenciais na longevidade: o sono, a alimentação, os exercícios, a comunidade e um propósito na vida. A nossa saúde é 80% estes pilares. Os outros 20% são fornecidos pelos equipamentos que temos aqui”, diz Corleo. No centro, a recomendação costuma ser de sessões de pelo menos uma hora, que custam 90 euros (ou 72 para membros do clube, sendo que os pacotes podem reduzir o preço para até 54 euros), e que habitualmente são combinadas com os outros tratamentos disponíveis. O cilindro com uma janela de vidro fica atrás de uma estante com plantas, perto da cadeira onde é feita a terapia de hipóxia e hiperóxia intermitente, que também fica ao lado das camas de terapia vibroacústica. Ao fundo, um vidro deixa visível a sauna para até 25 pessoas e a banheira de água gelada, numa temperatura de 8ºC, para 6 a 8 pessoas. Há ainda, em salas separadas, uma câmara para terapia de flutuação e uma sauna infravermelha.




▲ A câmara hiperbárica é apenas um dos tratamentos para a longevidade oferecidos no Healthy Horizon
FRANCISCO ROMÃO PEREIRA/OBSERVADOR
Foi a sair do cold plunge (o banho de imersão em água gelada) que falámos com Sam, um norte-americano empreendedor do setor da tecnologia com 35 anos, que está a viver um ano sabático e escolheu Lisboa como casa. Mostra-nos o grupo de biohacking em que participa no Telegram, diz que já fez sessões em câmaras na Polónia e na casa de um amigo, e agora tem o objetivo de completar 20 sessões no período de um mês. “É provavelmente a técnica de biohacking mais eficaz que podes fazer. Melhorei a minha saúde digestiva, da pele, durmo melhor, aumentou a minha HRV (variabilidade da frequência cardíaca), melhora a recuperação, crescimento de músculos”, diz. “A sensação é a de mergulhar numa piscina muito funda. Podes sentir pressão no rosto e ouvidos ou nos pulmões. Também podes sentir alguma ansiedade, porque estás fechado neste tubo, que ainda pode fazer alguns barulhos estranhos. Mas depois que superas isto, pode até ser um pouco entediante. Só ficas lá, a respirar, até o tempo que dura a sessão”, afirma Sam.
Ainda a tentar distanciar-se do ambiente hospitalar, mas mais próxima de um conceito médico, desde 2023 a Galerie Clinic,no Porto, foca-se em tratamentos para o envelhecimento saudável. “Temos um conceito de wellness. É uma clínica onde fazemos tratamentos médicos, mas também um sítio de bem-estar, como se fosse um spa médico”, explica Rita Sêco, médica especialista em medicina estética e fundadora da clínica. O espaço privilegia as luzes quentes e os materiais orgânicos, com linhas arredondadas e paredes com revestimento em madeira. “Fazemos tratamentos em medicina estética e a parte da longevidade, onde nós temos a câmara hiperbárica, a crioterapia e as massagens que têm a ver com a parte linfática. Tudo que seja cientificamente comprovado”, afirma a médica.




▲ Na Galerie Clinic a câmara tem uma televisão posicionada para entreter os pacientes durante as sessões que duram cerca de uma hora
João Ferrand - Fotografia
Recorrem ao tratamento hiperbárico na clínica pacientes que procuram alta performance física, como é o caso de atletas de competição, ou ainda pessoas que querem um bem estar “a nível cognitivo, de sono e recuperação”. “A câmara hiperbárica numa situação saudável, sem nenhum tipo de sintoma, faz sentido a nível de longevidade das células. É um tratamento de medicina regenerativa, ou seja, tentar que as nossas células sejam expostas a oxigénio numa intensidade mais alta para renovar internamente algumas células que estejam mais cansadas”, explica Rita Sêco.
“De dois em dois meses faço um ciclo de dez sessões. Às vezes, em situações agudas, se eu tiver períodos que fiquei com uma gastrite ou estou doente, espero ficar melhor e faço três seguidas, como se fosse um shot.”
Rita Sêco, fundadora da Galerie Clinic
Aliás, a própria médica é adepta dos tratamentos hiperbáricos. “De dois em dois meses faço um ciclo de dez sessões. Às vezes, em situações agudas, se eu tiver períodos em que fiquei com uma gastrite ou estou doente, espero ficar melhor e faço três seguidas, como se fosse um shot.” Na clínica, costumam indicar protocolos de sessões seguidas, com pacotes de 10 a 1500 euros. Na câmara hiperbárica há uma televisão para entreter os pacientes durante um período de 45 minutos a uma hora. “Há pessoas que preferem dormir e ficam a descansar. Há outras que já estão a ver uma série, então nós sabemos quem é a cliente e já deixamos no episódio que estão a ver”.
Principais indicações: cicatrização, necroses e fraturasDe acordo com o Comité Europeu de Medicina Hiperbárica, são muitas as indicações de tratamento baseadas em evidências científicas, sendo consenso algumas como: envenenamento por monóxido de carbono, fraturas expostas ou lesões por esmagamento, lesões de radioterapia, doença descompressiva, embolia gasosa, infeções por bactérias anaeróbias, surdez súbita, feridas de cicatrização lenta, exertos de pele comprometidos, queimaduras e necroses ósseas.
São estas também as principais indicações no Centro de Medicina Hiperbárica do Hospital da Luz de Lisboa, que tem uma câmara hiperbárica com capacidade para 16 pessoas. “A medicina hiperbárica é relativamente recente, tem 40 anos”, explica Cláudia Febra, a médica coordenadora do serviço. “Existe ainda pouco conhecimento por parte das diferentes comunidades, estejamos a falar da comunidade geral ou da científica”, diz a médica internista e intensivista, que, a partir da sua experiência clínica, relata que com o tratamento é possível “desinflamar, fazer uma cicatrização mais rápida e eficaz e matar bactérias que não gostam de oxigénio. Também há determinados tecidos, como por exemplo tumores que são hipóxicos, que ao dar oxigénio crescem menos”.


▲ A câmara hiperbárica do Hospital da Luz de Lisboa tem capacidade para tratar 16 pessoas simultaneamente e chega a uma pressão equivalente a um mergulho de 20 metros de profundidade
Sara Matos
Diante dos benefícios na cicatrização e desinflamação, o tratamento também é empregado na medicina estética. Na Up Clinic, em Lisboa, a câmara hiperbárica faz parte da recuperação dos tratamentos para a produção de colagénio, como os lasers ou a radiofrequência microagulhada, assim como na prevenção de complicações pré e pós cirurgias. “Em pacientes fumadores ou com doenças autoimunes, são recomendadas uma ou duas sessões para ter o máximo de segurança vascular a nível dos tecidos que nós vamos depois trabalhar na operação. No pós-cirúrgico, a realização é muito importante porque acelera a recuperação e cicatrização e minimiza a inflamação. Já se tivermos deficiência vascular dos tecidos, então a câmara hiperbárica vai melhorar e muitas vezes pode salvar uma pele que poderia levar a uma necrose”, explica o cirurgião plástico Tiago Baptista Fernandes, diretor clínico do espaço.
Para além das indicações relacionadas com a cicatrização e a recuperação pós-cirúrgica, na Oxyclinic, também em Lisboa, a câmara hiperbárica é usada para inflamações intestinais, neurológicas ou articulares, fadiga, fibromialgia e para o apoio complementar em contexto oncológico, sempre com a premissa de que o tratamento “permite ao corpo absorver oxigénio de forma muito mais eficiente”, diz a especialista em ozonoterapia Carina Guerreiro, CEO e fundadora da clínica. Ainda com a intenção de reduzir os efeitos do tempo no corpo, o espaço promove estratégias terapêuticas que incluem nutrição funcional, modulação mitocondrial, terapias endovenosas e suplementação personalizada. “No campo da longevidade, utilizamos esta terapia em programas personalizados com sessões de manutenção periódica, para promoção de saúde celular e prevenção do envelhecimento precoce”.
Benefícios no sono, recuperação física e alívio das doresNo “spa médico” do Porto, Rita Sêco diz que o benefício mais citado pelos clientes está relacionado com o sono. “Conseguimos a nível cerebral ter oxigénio suficiente para fazer um balanço de oxidação e antioxidantes e, ao reduzir o stress oxidativo, conseguimos com que os neurónios fiquem ‘mais calminhos’ e, por isso, as pessoas descrevem que começam a sentir que o sono é mais profundo”, diz a médica. “Quando estão a fazer períodos de câmara hiperbárica, dizem que parece que estão sempre ativas, que sentem que o corpo e a cabeça não se cansam”, relata.
"É uma evidência comum da minha atividade do dia-a-dia, as pessoas que têm previamente alterações de sono, como dificuldade em adormecer ou dormem poucas horas e ficam acordadas às vezes durante a noite, relatam sistematicamente melhora."
Cláudia Febra, coordenadora do Centro de Medicina Hiperbárica do Hospital da Luz
Cláudia Febra, a coordenadora do Centro de Medicina Hiperbárica do Hospital da Luz de Lisboa, também defende os efeitos positivos no sono, apesar de não ser este o principal objetivo dos pacientes que procuram o tratamento no hospital. “É uma evidência comum da minha atividade do dia a dia, as pessoas que têm previamente alterações de sono, como dificuldade em adormecer ou dormem poucas horas e ficam acordadas às vezes durante a noite, relatam sistematicamente melhoras”. A médica diz ainda que a sensação após uma sessão é mesmo de disposição e menos cansaço. “As pessoas saem de um tratamento com câmara hiperbárica cheias de energia. Costumo dizer que a quantidade de oxigénio que entrou continua nas células durante umas três ou quatro horas. Portanto, é comum haver uma sensação de energia, do ponto de vista geral — física, mental — que vai diminuir ao longo do dia. Quando a pessoa volta a fazer uma nova sessão, volta a ter exatamente a mesma sensação”.
A médica intensivista também é otimista sobre o uso da medicina hiperbárica para a recuperação física no âmbito do desporto. “O oxigénio hiperbárico resulta numa cicatrização mais eficaz e muitas vezes mais rápida. Nós temos vários casos de atletas de alta competição em tratamento”, explica. “Também está a ser muito estudado, e com resultados, a utilização de oxigénio na terapia hiperbárica para performance”. A médica Rita Sêco, da Galerie Clinic, no Porto, fala também nos benefícios do tratamento para dor crónica, como no caso da fibromialgia. “Com a recuperação celular rápida, as pessoas sentem que começa a diminuir a dor. Temos muitos pacientes que fazem sessões de câmara hiperbárica porque percebem que deixaram de tomar medicação para a dor”, relata.
Reversão do processo de envelhecimentoEm 2022, o Comité Europeu de Medicina Hiperbárica e a Sociedade Europeia Subaquática e Baromédica emitiram um parecer no qual “desaconselham fortemente a promoção e o uso destes equipamentos para alegações não verificadas como wellness, aumentar a energia ou tratamentos de doenças para os quais não existem evidências científicas e clínicas suficientemente revisadas pelos pares.” Dois anos antes, um estudo realizado entre a Universidade de Telavive e a unidade de medicina hiperbárica do Centro Médico Shamir, em Israel, tinha encontrado uma relação entre as sessões com câmaras hiperbáricas e a redução do encurtamento dos telómeros, um dos principais marcadores do processo de envelhecimento celular. No estudo, 30 pessoas com mais de 65 anos foram submetidas a 60 sessões diárias de 90 minutos, com 100% de oxigénio e a uma pressão de 2 atmosferas, durante um período de três meses. Os investigadores descobriram que, ao fim do tratamento, os telómeros na verdade ficaram mais compridos. De acordo com o médico israelita Shai Efrati, em declarações ao Times of Israel, o tratamento não só reduz o declínio da capacidade fisiológica mas “reverte o envelhecimento”. O próprio especialista participou no estudo e alega que “entrou saudável e saiu como um tigre”.
"Há estudos que mostram que um determinado número de sessões provoca um alongamento dos telómeros, que são uma porção dos cromossomas que são marcadores de envelhecimento. E depois naturalmente temos uma melhoria da função cerebral, da qualidade de vida e do descanso. É uma área muito interessante e penso que cada vez vamos assistir a mais estudos serem realizados neste sentido."
Tiago Baptista Fernandes, cirurgião plástico e diretor clínico da Up Clinic
São pesquisas como esta que formam a base dos que acreditam no potencial do tratamento para fins de longevidade. “Aumentando a oxigenação naturalmente vai melhorar o efeito no envelhecimento. Como? Diminuindo o stress oxidativo, o que significa que a reconstrução e a reparação das nossas células vai melhorar. Há estudos que mostram que um determinado número de sessões provoca um alongamento dos telómeros, que são uma porção dos cromossomas que são marcadores de envelhecimento. E depois naturalmente temos uma melhoria da função cerebral, da qualidade de vida e do descanso. É uma área muito interessante e penso que cada vez vamos assistir a mais estudos serem realizados neste sentido”, opina o cirurgião plástico Tiago Baptista Fernandes.
Cláudia Febra considera, no entanto, que é preciso ter cautela. “O que se começa a tentar estudar e perceber é qual é o impacto em termos de medidores, células inflamatórias e proteínas associadas ao envelhecimento e perceber se o oxigénio hiperbárico poderá ser um retardador do processo de envelhecimento. Mas não temos tempo suficiente em termos de utilização do oxigénio hiperbárico nos indivíduos humanos para poder perceber se, para além destas utilizações, o efeito de as pessoas viverem mais tempo com a melhor qualidade resulta. Ainda não existe evidência científica associada a estes processos”, diz.
Apesar das investigações científicas ainda serem muito recentes, a câmara hiperbárica mostra-se como um tratamento com potencial para ser bom para quase tudo e para praticamente todos. “A única contraindicação absoluta, ou seja, o único doente que não poderia entrar numa câmara hiperbárica, é o doente que tem uma situação chamada pneumotórax não-drenado, ou seja, tem ar fora do pulmão e ainda não foi colocado o dreno. Portanto, as chamadas contraindicações absolutas não existem. É claro que existem as chamadas contraindicações relativas, e neste caso, nós temos de avaliar se o benefício que expectávamos é suficiente para ultrapassar os riscos. O mais comum são pessoas com problemas de ouvidos que, com a variação da pressão, possam ficar acentuados. Outra das situações também bastante comuns que nós temos de avaliar é o enfisema pulmonar grave, particularmente associado ao tabaco”, explica Cláudia Febra, médica do Hospital da Luz.
Ainda assim, as clínicas e centros contactados pelo Observador garantem confirmar possíveis contraindicações antes da utilização. No clube de longevidade de Lisboa, por exemplo, João Corleo, um dos fundadores, esclarece: “Uma pessoa que sofra de claustrofobia, que entra em pânico, tenha problemas cardíacos ou problemas respiratórios: essas são as grandes contraindicações que nos impossibilita de aceitar uma pessoa fazer esse tratamento”. O mesmo aponta a médica Rita Sêco, da Galerie Clinic, no Porto: “A contraindicação maior é todos os problemas pulmonares. A câmara hiperbárica é o remédio para tudo, menos para doenças que tenham a ver com o pulmão”.
Por outro lado, é um dispositivo que apresenta riscos. Em janeiro uma câmara hiperbárica explodiu nos Estados Unidos da América e um menino de cinco anos morreu no incidente. “O oxigénio é reativo, é como se fosse um combustível. Na presença de uma eletricidade estática ou outra coisa, pode fazer uma faísca”, explica Rita Sêco. Sendo assim, as pessoas são orientadas a entrarem na câmara sem metais, dispositivos eletrónicos e a usarem peças de roupas 100% algodão. O risco reduz consideravelmente em equipamentos que fornecem o oxigénio através de uma máscara — o que é o caso das câmaras multilugares presentes nos hospitais, e também de algumas monolugares, como a do clube de longevidade Healthy Horizon.


▲ A câmara do clube de longevidade Healthy Horizon, em Lisboa, fornece oxigénio através de uma máscara, o que reduz o risco de explosão
FRANCISCO ROMÃO PEREIRA/OBSERVADOR
Todos os espaços contactados pelo Observador que oferecem sessões em câmara hiperbárica alegam ter profissionais formados para operar o dispositivo, sejam médicos, enfermeiros, fisioterapeutas ou técnicos. De acordo com o código europeu de boas práticas, é importante a presença de uma equipa para supervisionar o equipamento, o paciente e prestar assistência no caso de emergência.
A “polémica” da pressãoO código de boas práticas também define que o termo terapia de oxigénio hiperbárico (em inglês, HBOT), só pode ser usado quando a pressão na câmara é acima de 1,5 atmosferas. Abaixo disso, o consenso é usar o termo mild (mHBOT), que em português pode ser traduzido como leve ou moderado.
É o caso da câmara hiperbárica do clube de longevidade de Lisboa, que chega a uma pressão de 1,5 atmosferas, o equivalente a um mergulho de cerca de 5 metros de profundidade. “Só acima disso é que é considerado um equipamento médico, mas de qualquer das maneiras, coloca uma pessoa no estado fora daquilo que é o habitual, portanto dá resultados. Mas são tratamentos recentes, não há ainda um histórico de relatórios de acompanhamento médico de muitos anos”, justifica João Corleo.
“Sabemos que existem outras câmaras disponíveis no mercado, nomeadamente em centros de bem-estar ou longevidade, que operam a pressões mais baixas — geralmente entre 1,3 e 1,5 atmosferas — e que, embora possam ter benefícios em certos contextos preventivos, não atingem o mesmo grau de penetração terapêutica que a hiperbárica médica.”
Carina Guerreiro, CEO da Oxyclinic
Já o dispositivo presente na clínica de longevidade do Porto alcança as 3 atmosferas. “Nós tentámos procurar uma câmara que pudesse ser útil a nível médico e que conseguisse chegar à pressão ideal para fazer tratamentos mais agressivos, apesar de nós só tratarmos de longevidade. Portanto, tudo que são tratamentos hospitalares optamos por não fazer, porque não temos tanta experiência a nível de cirurgias grandes ou de amputações”, explica Rita Sêco. A câmara da Oxyclinic, de Lisboa, que foca em medicina funcional, integrativa e de longevidade, também chega às 3 atmosferas. “Para que este efeito seja verdadeiramente terapêutico, é fundamental o fator pressão”, diz a fundadora, Carina Guerreiro. “Sabemos que existem outras câmaras disponíveis no mercado, nomeadamente em centros de bem-estar ou longevidade, que operam a pressões mais baixas — geralmente entre 1,3 e 1,5 atmosferas — e que, embora possam ter benefícios em certos contextos preventivos, não atingem o mesmo grau de penetração terapêutica que a hiperbárica médica”, afirma.
A coordenadora de Medicina Hiperbárica do Hospital da Luz também concorda e afirma que os resultados já comprovados só foram observados em câmaras que atingem mais de 2 atmosferas, o que imita a pressão de um mergulho numa profundidade de 10 metros. “Não existe nenhuma evidencia científica de que [câmaras de mHBOT] tenham qualquer efeito no oxigénio. É o mesmo que receber oxigénio fora da câmara”, diz Cláudia Febra. “Acho que o papel mais correto é procurar informação. Cada pessoa faz a sua escolha informada”, conclui a médica.
observador