Vieira dispara para todos, mas não confirma candidatura

98 dias. É esse o tempo que falta até às eleições do Benfica, que prometem ficar para a história. Numa altura em que estamos prestes a entrar nos derradeiros três meses de “campanha”, são cinco os candidatos oficialmente conhecidos: Cristóvão Carvalho, João Diogo Manteigas, João Noronha Lopes, Martim Mayer e Rui Costa. No entanto, é em torno do eventual número seis que tem gravitado esta semana. A candidatura de Luís Filipe Vieira à presidência encarnada voltou a ganhar forma nas últimas semanas e, ao longo dos últimos dias, começaram a surgir notícias a confirmar isso mesmo. Primeiro, Sérgio Conceição foi apontado como possível treinador do antigo presidente, numa informação que não se deverá confirmar. Depois, Carlos Janela, que trabalhou com Vieira no Benfica e é seu amigo, esteve na CMTV a dar uma espécie de pontapé de saída na candidatura… que (ainda) não se confirmou.
Pelo meio, Luís Filipe Vieira deu uma entrevista ao jornal Correio da Manhã, sob o mote “é para ganhar”, onde confirmou estar a estudar a hipótese de regressar ao clube que presidiu entre 2003 e 2021 (remeteu a decisão para as “próximas semanas”) e deixou críticas a Rui Costa e às restantes candidaturas. “Não tenho uma decisão tomada, mas sinceramente não excluo essa possibilidade em função do que foram os últimos quatro anos. Este último mandato revelou uma falta de liderança e visão preocupantes para todos os benfiquistas. Perdemos protagonismo, perdemos influência. O Benfica precisa de recuperar voz e peso nos organismos nacionais. Isso só se faz com uma liderança forte, com presença e com visão global, não com silêncio e ausência. A verdade é que, entre os candidatos conhecidos, não vejo ninguém capaz de inverter o rumo. Se sentir que sou necessário, estarei disponível”, começou por dizer Vieira, apontando para todas as direções.
Quanto à presidência de Rui Costa, que assumiu o cargo, inicialmente de forma provisória, em julho de 2021, depois da detenção de Vieira, o ex-dirigente assumiu que se “enganou”, já que o maestro “não conseguiu provar que era o futuro”. “Quando fui forçado a sair, em 2021, a dívida do Benfica era inferior a 100 milhões de euros. Hoje já vai quase nos 300, com tendência para aumentar. Éramos influentes nos organismos desportivos, determinados, ouvidos, coisa que deixámos de ser. A última eleição para a FPF foi algo penoso de assistir. O Benfica precisa de liderança firme e de um plano claro, e não tem tido isso”, acrescentou. Questionado sobre Noronha Lopes, Vieira lembrou 2003: “Há momentos que definem a história e o novo Estádio da Luz foi o epicentro da revolução. Aí sim, houve quem se tenha escondido e não fui eu. Há um enorme desconhecimento do que é liderar o Benfica, apenas uma mão-cheia de frases feitas. Não sabe como funciona o Benfica por dentro, desconhece os dossiês, os desafios reais e critica por criticar. Não é solução”.
“Candidatura? Fui obrigado a pensar nisso. Mais quatro anos iguais a estes e ficaremos na mesma situação económica a que o FC Porto chegou no ano passado e que vai ter reflexos durante muitos anos. Não digo na mesma situação desportiva porque nessa já estamos há algum tempo. Se decidir avançar, o fator que determinará essa decisão é a avaliação que faço da atual situação do clube. Não trabalhei 20 anos para agora ver o Benfica a afundar, de braços cruzados. O Benfica precisa de voltar a ter rumo. Se decidir avançar, é para ganhar. Os benfiquistas sabem que podem contar comigo. Só peço aos sócios que comparem, que olhem para o que era o Benfica em 2001 [ano em que entrou no clube, como diretor desportivo, ndr] e o que era em 2021, e que vejam o que se passou nos últimos quatro anos. Depois disso, se entenderem que posso ser útil, estarei cá. O Benfica não pode viver de simpatias ou aparências, precisa de trabalho, visão e coragem. E isso nunca me faltou”, sublinhou.
Corria o ano de 2019 quando, em plena Assembleia Geral (AG) do clube, os ânimos se exaltaram e o antigo presidente terá agarrado um sócio pelo pescoço. Volvidos quase seis anos, Luís Filipe Vieira está em risco de ser expulso de sócio do Benfica, à luz dos Estatutos das águias. Questionado sobre esse processo, que avanço, lentamente, sobre a presidência de Rui Costa, Vieira garante que não está “rigorosamente nada” preocupado. “Trata-se de um processo de inquérito de intuito claramente persecutório que é ilegal, mas sobretudo injusto. Não foi um momento feliz, mas sem a gravidade que pretendem atribuir ao mesmo. Foi tão grave que, passados mais de cinco anos, nada se fez… Uma pequena minoria de sócios aproveita as AG para insultar e, às vezes, ameaçar. Vão apenas para insultar. Aconteceu comigo e continua a acontecer. Indignei-me durante uma dessas intervenções. Responsáveis? Aqueles que querem, a todo o custo, fugir às responsabilidades, ao escrutínio da má gestão e ao debate sobre o futuro do clube. Aqueles que receiam que eu possa voltar a liderar o clube”, completou.
Nesta entrevista, o homem de 76 anos que foi a principal figura da presidência mais longa da história do Benfica, abordou ainda os seus casos judiciais, garantindo que está inocente. “Passado este tempo, nem eu nem o Benfica fomos condenados. Sei que estou inocente e mantenho a plena confiança na justiça portuguesa. Não há nenhum impedimento e tenho o direito de participar na vida do clube como qualquer sócio e sem qualquer receio. Condenação? É um cenário que os sócios não devem temer. Já houve dirigentes que foram alvo de inquéritos, acusações e julgamentos que se mantiveram na liderança dos clubes e não deixaram de ganhar. Aconteceu em Portugal e por essa Europa fora”, lembrou.
“Vieirismo? Algumas pessoas usam esse termo de forma depreciativa, como se o Vieirismo tivesse representado algo de mau para o Benfica, quando foi efetivamente o contrário. Falar de Vieirismo é falar de anos de muito trabalho e sacrifício, que permitiram salvar o clube, construir um dos melhores estádios europeus, um dos melhores centro de estágio a nível mundial, liderar nas negociações dos direitos televisivos, criar a primeira televisão de um clube em Portugal, profissionalizar o clube, fazer da formação do Benfica uma das mais conceituada a nível global, ir a duas finais europeias, ganhar um histórico tetra e fazer um projeto olímpico que dignificou Portugal. Resumidamente, isto é o Vieirismo. O Vieirismo é compromisso, credibilidade financeira, pôr o Benfica acima de tudo, modernizar sem perder identidade, ganhar, ser respeitado na Europa e liderar sem ir atrás dos outros”, elencou.
Por fim, Vieira disse que “é exagerado falar em hegemonia” do Sporting “quando se ganham dois Campeonatos”, mas frisou que o rival “ocupou o lugar que este Benfica lhe permitiu ocupar e nisso a atual direção tem culpa”. Quanto ao seu treinador, assumiu a ligação que tem com Sérgio Conceição, mas não apontou nomes, garantindo apenas que Bruno Lage “não é um treinador agregador e consensual”. Questionado sobre João Félix, que tem sido apontado ao regresso à Luz, o ex-presidente lembrou a dívida do clube: “Há decisões que não dependem apenas da componente desportiva, mas da sustentabilidade do clube. Gosto muito do João, mas há outras condicionantes que devem ser tidas em conta. Espero que a atual direção tenho isso em conta. O Benfica precisa de identidade. O que gostaria mesmo era de não perder os que cá temos — António Silva, Florentino e Tomás Araújo”.
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