Como João Félix decidiu rumar ao Al Nassr em 48 horas

Apesar de todos os sinais que iam chegando de vários lados, ainda existia quem não acreditasse na hipótese de João Félix rumar à Arábia Saudita. Pela “promessa” feita ao Benfica de que faria de tudo para regressar à Luz, por estar num ponto da carreira em termos de idade que não seria propriamente o mais desejável para sair do radar das grandes equipas europeias, pela proximidade que parecia ter de uma contratação a título definitivo dos encarnados. No entanto, as primeiras notícias que começaram a surgir na noite de sábado eram mais do que fumo. A saída para o Al Nassr já se tinha tornado inevitável e houve relações que ficaram a “ferro e fogo” após este desenlace, assumido em termos internos como uma “derrota” inesperada.
No Benfica, sobra o sentimento de que tudo foi feito para que o avançado regressasse este verão ao clube, até que a última proposta apresentada ao Chelsea já comportava um investimento como nunca tinha acontecido antes, mas que a vontade do jogador acabou por prevalecer – uma vontade que mudou e que por isso causou bastante incómodo na Luz, entre Rui Costa e o próprio Bruno Lage, que falara com o internacional muito antes para lhe explicar tudo o que tinha projetado para a temporada de 2025/26 e que não mais voltou a ter um contacto por parte de João Félix. Também a ligação ao agente Jorge Mendes, que esteve sempre a comandar todas as operações, saiu afetada tendo em conta a proximidade que parecia haver de um acordo.
O que mudou? Como o Observador escreveu este domingo, a posição de João Félix. Há muito que o jogador de 25 anos percebera que não ficaria no AC Milan, onde jogou por empréstimo nos últimos seis meses, e que também não teria oportunidade de integrar as opções do plantel comandado por Enzo Maresca no Chelsea. Aí, Jorge Mendes recebeu sondagens da Turquia e da própria Arábia Saudita, cenários colocados de parte por João Félix perante a vontade de manter-se na Europa. Faltando mais opções para prosseguir a carreira, o avançado assumiu de forma aberta o interesse em voltar ao Benfica, assumindo que essa seria a melhor forma de encontrar uma plataforma para relançar a carreira. Todas as vontades pareciam conjugadas.
“Toda a gente sabe que o Benfica é o clube do meu coração, um dia hei de voltar certamente, não sei se é agora ou no futuro. Tenho algumas ideias na minha cabeça, ficar em Inglaterra ou voltar ao Benfica é uma das opções. A minha família está cá, sinto que preciso estar em casa e daí o Benfica ser uma das ideias que tenho na cabeça. O Benfica é a minha casa, se voltar agora ficarei contente. Sendo o Bruno Lage o treinador, um mister que conheço e foi importante para a minha carreira, ganha uns pontos na minha decisão e claro que vejo com bons olhos voltar ao Benfica. É, se calhar, para onde estou mais inclinado”, assumiu na primeira semana de julho. A confiança num regresso era tanta que os próprios jogadores falavam da questão de forma aberta, como aconteceu com Florentino Luís durante o Mundial de Clubes. Todos queriam Félix.
Foi nessa base que Benfica e Chelsea foram avançando nas negociações pelo avançado, que colocaram logo de lado a possibilidade de um novo empréstimo temporário como acontecera em relação ao AC Milan. A oferta inicial colocou 20 milhões de euros em cima da mesa por 50% do passe, ficando os ingleses com metade dos direitos económicos. De seguida, até pelos valores envolvidos na contratação de Richard Rios, a proposta subiu aos 25 milhões fixos por metade do passe, um montante mais próximos daquilo que os blues tinham pago ao Atl. Madrid (52 milhões). Questão? Os campeões mundiais não queriam ficar “pendurados” com o resto do passe. E foi nesse ponto que as negociações entre ambos começaram a bloquear.
O Benfica teve conhecimento também através de Jorge Mendes de que a Arábia Saudita tinha voltado à carga pelo jogador na semana passada, o que teve o condão de acelerar novas rondas de negociações entre as duas partes. Apesar disso, os encarnados continuavam a contar com a vontade do jogador, trabalhando para que fosse possível assegurar uma plataforma de entendimento com os londrinos o mais depressa possível. Na última proposta feita no sábado, quando o Chelsea chegou a dar autorização para Félix viajar para Lisboa, estavam em cima da mesa 25 milhões de euros por metade do passe mais cinco milhões em 2027 e mais cinco milhões em 2028 para ficar com 70% caso não fosse vendido, cumprindo esse desejo de “minimizar” a diferença face ao investimento feito pelos ingleses. No entanto, o cenário já tinha mudado de figura.
Até meio da tarde de sábado, existia ainda uma pequena esperança de que João Félix pudesse ser anunciado na Eusébio Cup. A partir de meio da tarde de sábado, essa possibilidade não existia mas a hipótese de haver negócio antes da Supertaça continuava de pé. À noite, já depois do triunfo por 3-2 diante do Fenerbahçe, o “sonho” estava esfumado: não só o Al Nassr pagava mais ao Chelsea como o jogador já tinha mostrado total abertura para rumar à Arábia Saudita de Jorge Jesus e Cristiano Ronaldo, que ligou ao seu companheiro de Seleção para tentar convencê-lo a mudar para uma outra realidade que lhe permitia ter minutos de forma regular, lutar por títulos e ficar mais perto de entrar nas contas para o Mundial de 2026.
Até o acordo com João Félix surpreendeu a Benfica SAD. O Al Nassr comprometeu-se a pagar 30 milhões de euros pelo jogador mais 20 milhões de variáveis, assegurando que o Chelsea não perdia entre a contratação e a venda, mas apresentou um contrato válido apenas até 2027, altura em que o avançado português terá 27 anos e o passe na mão para escolher o próximo destino. Já em relação a ordenados, a diferença era diferente e de forma substancial: os encarnados propunham-se a pagar três milhões de euros limpos por época (seis milhões de encargos para a SAD, entenda-se), o internacional vai receber 12/13 milhões de euros por cada temporada que podem ainda chegar aos 15 milhões mediante concretização de objetivos desportivos.
João Félix chegou este domingo à Áustria, onde o Al Nassr está a fazer o habitual estágio de pré-temporada na estreia de Jorge Jesus na equipa depois da passagem pelo rival Al Hilal, e já treinou com os seus novos companheiros na manhã desta segunda-feira, sendo depois apresentado de forma oficial pelo conjunto de Riade. Nenhuma das partes fez qualquer comentário sobre o volte-face na novela mas começaram a surgir em público algumas críticas à opção do internacional português, nomeadamente de Mario Suárez, antigo capitão do Atl. Madrid que trabalhou com o avançado (e com Diego Simeone) nos colchoneros.
“Incrível! Ir para a Arábia aos 25 anos depois de vários anos sem ser titular em várias equipas… Isto demonstra que só o talento (que tem, todo o que há no mundo) não importa, o importante é a mentalidade, a atitude e as ‘ganas’ de triunfar e adaptar-se ao sítio onde está. Estariam o Atlético, que pagou 120 milhões de euros, e Diego Simeone enganados? Qual é a vossa opinião? Dito isto, toda a sorte do mundo nesta nova etapa. E o mais importante de tudo: que seja feliz”, escreveu o antigo médio nas redes sociais. Apesar das críticas à decisão, o Al Nassr vai mesmo ser o quinto clube como sénior do jogador, depois das passagens por Benfica, Atl. Madrid, Barcelona (por empréstimo), Chelsea e AC Milan (também emprestado).
Apesar de já estar a treinar com os novos companheiros, João Félix só foi oficializado esta terça-feira, na sequência de novas negociações com jogador e Chelsea. Por um lado, o Al Nassr quis garantir que tinha uma cláusula de renovação no contrato válido até 2027, por forma a que o avançado não saísse a custo zero sem qualquer benefício desportivo ou financeiro. Por outro, os londrinos fizeram questão de colocar margem para uma possível recompra daqui a dois anos. No final, tudo ficou solucionado. “Estou aqui para espalhar alegria. Vamos ganhar juntos”, comentou o internacional português na apresentação oficial do clube.
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