Proposta da ciência de criar uma 'Arca de Noé microbiana' para salvar esses microrganismos da extinção

Micróbios , pequenos organismos vivos como bactérias, vírus e fungos , são encontrados nas plantas, no meio ambiente e em nossos corpos, onde formam o microbioma . Esses microrganismos são essenciais para a saúde humana porque auxiliam na digestão, fortalecem o sistema imunológico e protegem contra patógenos .

Mas para estudar o microbioma e seus benefícios para o corpo, é importante ter o máximo de micróbios saudáveis ​​possível e preservá-los em uma coleção global semelhante ao Banco Global de Sementes de Svalbard , na Noruega, o bunker onde sementes de todo o mundo são armazenadas para proteger a biodiversidade de espécies de cultivo no caso de uma catástrofe global.

Nesta sexta-feira, Dia Internacional do Microbioma , uma equipe internacional de 25 cientistas envolvidos na iniciativa acaba de publicar um artigo na revista Nature Communications no qual apresentam um marco ético para garantir o futuro deste repositório.

" A Iniciativa do Repositório da Microbiota representa um esforço proativo para proteger e preservar a vida microbiana que é essencial para a saúde do nosso planeta e de seus habitantes", disse María Gloria Domínguez-Bello, presidente da iniciativa e professora de Ciências Ambientais e Biológicas na Universidade Rutgers (Estados Unidos).

Plantas, alimentos e o meio ambiente também possuem microbiomas essenciais. Por exemplo, os micróbios do solo ajudam as plantas a crescer por meio da ciclagem de nutrientes, e alimentos fermentados, como iogurte, contêm bactérias benéficas que contribuem para a saúde intestinal.

Os microbiomas ambientais, como os do permafrost do Ártico, são essenciais para controlar as emissões de gases de efeito estufa .

Mas, de acordo com a pesquisa de Domínguez-Bello, os microbiomas estão cada vez mais ameaçados pela atividade humana que perturba seu equilíbrio natural .

Em humanos, o uso excessivo de antibióticos , cesáreas e alimentação com fórmula pode reduzir a diversidade de micróbios intestinais, aumentando o risco de alergias, doenças autoimunes e distúrbios metabólicos. E, nos alimentos, o uso excessivo de conservantes e aditivos pode prejudicar micróbios benéficos .

"O microbioma está sob uma enorme ameaça que, em muitos aspectos, é análoga às mudanças climáticas", alerta Martin Blaser, membro do conselho de diretores da iniciativa, diretor do Centro de Biotecnologia e Medicina Avançada da Universidade Rutgers e coautor do artigo.

"As atividades humanas estão esgotando nosso microbioma, e há muitas evidências disso. Nas plantas, práticas agrícolas insustentáveis, como o uso intensivo de pesticidas , podem destruir os microbiomas do solo, essenciais para a ciclagem de nutrientes e a saúde das plantas", afirma Blaser.

E os microbiomas ambientais são afetados pela poluição, mudanças climáticas e destruição de habitats , o que pode levar à perda de micróbios que regulam as emissões de gases de efeito estufa e mantêm a estabilidade do ecossistema.

A iniciativa visa apoiar os esforços para identificar micróbios saudáveis, armazená-los e congelá-los antes que desapareçam . Na fase piloto, já concluída, cientistas coletaram mais de 2.000 amostras fecais e de alimentos fermentados de vários países.

Além disso, naquela época, a iniciativa cresceu de um punhado de cientistas de alguns países para mais de 100 de 32 países.

Amostras microbianas são armazenadas temporariamente em condições criogênicas no Instituto de Microbiologia Médica da Universidade de Zurique , mas a próxima fase da iniciativa buscará um local permanente para abrigar o depósito de amostras (possíveis locais na Suíça, Canadá e outros climas frios estão sendo considerados).

Além disso, durante a mesma fase, chamada de "Fase de Crescimento 1", que durará até 2029, os cientistas expandirão a coleção para 10.000 amostras e buscarão ativamente financiamento governamental além do apoio filantrópico atual.

A estrutura ética da iniciativa descrita no documento foi elaborada para garantir que a preservação da diversidade microbiana seja realizada de maneira justa, respeitosa e inclusiva.

Os princípios-chave incluem a soberania do depositante, a colaboração equitativa e a governança ética para que os coletores originais mantenham a propriedade e o controle de suas amostras microbianas.

Além disso, a iniciativa enfatizará a importância de respeitar o conhecimento local e garantir que os benefícios sejam compartilhados de forma justa , e priorizará considerações éticas, incluindo os direitos das comunidades indígenas e a necessidade de processos de tomada de decisão transparentes e inclusivos.

E embora ainda faltem tecnologias facilitadoras para utilizar totalmente a coleção, os cientistas que trabalham na iniciativa preveem que, no futuro, as amostras poderão ser usadas para desenvolver novos tratamentos médicos, melhorar práticas agrícolas e restaurar ecossistemas danificados.

"Acreditamos que um dia a ciência irá melhorar o suficiente para que tenhamos técnicas de restauração realmente boas", conclui Blaser.